Bebendo da fonte Lethe
Com o olhar fixo, Beatriz encarava o Sol sem piscar, como águia alguma jamais teria feito. Como um raio, seu olhar se infundiu em minha mente que se deixou inundar com o reflexo da sua luz e fez com que eu também fitasse o Sol por mais tempo que eu seria capaz. Naquele lugar sagrado, muito mais coisas são permitidas aos sentidos humanos que aqui na Terra. Não pude olhar muito, mas o suficiente para ver a esfera do Sol contornada por faíscas, como fogo escapando de ferro derretido. Subitamente, pareceu-me que um dia iluminava o dia seguinte, como se Deus tivesse decorado o céu com outro Sol.
Livre da luz que preenchia as alturas, virei o olhar para Beatriz, que permanecia fitando o Sol. E então senti uma coisa que eu seria incapaz de descrever. Algo similar, talvez, à transformação sofrida por Glauco, ao provar a erva que o transformou em um deus. “Transumanizar,” é a melhor palavra que posso oferecer, para algo que não se pode explicar com palavras. Se era apenas a minha alma, separada do corpo, que subia, só aquele Amor que governa o Céu poderia dizer.
(continue a ler o Paraíso de Dante)
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