sexta-feira, março 06, 2020

Coelhinho guisado com batata frita

A Mari’mília e os seus dois amigos chegaram a casa dela em Peras Ruivas e encontraram uma ti’Núncia um bocado preocupada.
- Chegas tão tarde para almoçar.
Ela contou-lhe rapidamente a situação e o rosto da senhora abriu-se num sorriso.
- Então, almoçam os três aqui em casa. Tenho um coelhinho guisado que está uma maravilha. Frita mais umas batatas.
E, naquele dia, o Luís e o Amândio provaram os maravilhosos coelhinhos criados pela Nicha e cozinhados pela mãe.
- Tenho aqui um bom tintol – disse a Nicha. – Querem provar?
Claro que não se fizeram rogar. Daí a pouco comiam e bebiam à grande e à francesa. Mas o vinho, tão clarinho, era bastante forte. O Estorietas começou a sentir os efeitos do álcool e, passado um bocadinho, já cantarolava.
- Vou passar a vida a sonhar com os coelhinhos que tu cozinhas, Nicha…
- Olha, toma juízo, não bebas mais, porque daqui a pouco passa a camioneta e temos de voltar a Ourém.
Mas o vinho de Ourém, o maravilhoso vinho de Ourém, não perdoava a ninguém. Daí a pouco, o Luís e o Amândio regressavam com a Mari’mília a Ourém e foram todo o caminho a cantarolar.
Chegados à estação dos Claras, saíram e dirigiram-se a pé ao quartel dos bombeiros. O Dr. Armando ficou fulo quando os viu:
- O que é isto? Andaram nos copos durante uma visita de estudo?
- Isto passa, isto passa – dizia o Estorietas.
O comandante dos bombeiros apressou-se a acalmar a situação.
- Dr. Armando, eles não têm culpa da situação em que se viram metidos. A responsabilidade foi toda do corpo de bombeiros e da estúpida brincadeira do meu filho. Temos de ser mais cuidadosos em futuras visitas.
- Não haverá futuras visitas – respondeu o diretor do colégio. – Aliás, não sei se esta não é mais uma coisa que faz parte do imaginário mundo do Estorietas…



FIM

quinta-feira, março 05, 2020

O poder é quem vence

No regresso para Ourém, o Avião lembrou-se de um pormenor:
- Esperem, há pouco passei pelo João que parecia ir a pé para Ourém. E ele mentiu-me dizendo que os miúdos foram na direção do Vilar. Será que tinha alguma coisa a ver com o desaparecimento do jeep e me quis despistar?
- Mas, se isso é verdade, e ele ia a pé, só podia vir da estrada do Carregal.
- O melhor é irmos por lá antes de regressar ao quartel.
Não tardou estavam junto ao jeep abandonado.
- Foi isso mesmo. Ele não quis assumir. É maluco de todo…
Pararam junto do carro abandonado e tentaram ligá-lo, mas o motor não dava sinal.
- Avariou ou não tem gasolina.
Entretanto, o João, num rebate de consciência, tinha avisado o quartel do local onde estava o jeep e um reboque chegou ali naquele preciso momento.
O Avião ia-se atirando ao filho do comandante, mas este tinha uns anitos a mais e obrigou-o a ter juízo.
- Por que é me mentiste quando passei por ti? Ia sendo agredido por um velhote estúpido à entrada do Vilar.
- Não leves a mal. Fiz confusão com as duas estradas. Quanto ao resto, já informei o comandante do que tinha a informar. Não armes em investigador.
As coisas estiveram um pouco tensas. Os próprios bombeiros não gostarem do que estavam a assistir, mas… quem tem o poder é quem o pode exercer e todos se vergaram ao peso da estratificação social.
- E os miúdos?
- Já devem estar em Peras Ruivas. A rapariga estava com pressa de chegar a casa para almoçar e regressar a Ourém na camioneta.
- Então, podemos voltar ao quartel.
E todos regressaram a Ourém nos carros dos bombeiros acompanhando o reboque que levava consigo o jeep abandonado…

quarta-feira, março 04, 2020

Um avião em apuros

O condutor do jeep chegou a pé ao quartel e o comandante foi logo ter com ele.
- Que se passa? Onde está o carro? E os miúdos?
- Desapareceram – respondeu ele em pânico. – Fui comprar cigarros ao Central e abandonei-os por uns instantes. Quando voltei, já não os encontrei. Alguém os levou mais ao jeep pela estrada do regato.
O comandante ficou fulo.
- Incompetente! Não se abandonam três miúdos quando os conduzimos.
Entretanto, chegou o Dr. Armando que deitou logo as mãos ao pescoço do bombeiro.
- Malvado! Sabes o que fizeste? Vou dar-te uma sova…
Os miúdos estavam em pânico pela falta dos colegas. Que lhes teria acontecido? O comandante dirigiu-se ao diretor do colégio.
- Por favor, doutor, tenha calma. Esse homem depende de mim, terei de ser eu a aplicar-lhe o castigo merecido. Agora, temos de encontrar o jeep e os miúdos.
O Zé Rito (Avião) ouviu aquilo e disse logo:
- Vou já iniciar as buscas pela estrada do regato.
Ligou a mota, acelerou e partiu por ali abaixo.
- Trrrrrroooooooo…to…to…to….to
O comandante virou-se para os outros e disse:
- Os meninos e as meninas vão para o refeitório onde temos uma refeição preparada. Esperem lá por nós enquanto procuramos os vossos colegas. – virou-se para o doutor Armando. – Por favor, doutor, pegue no seu carro e procure-os na direção do Castelo. Eu e outros bombeiros vamos dividir-nos por outras estradas de Ourém.
Num instante, a busca foi organizada e os alunos do CFL do segundo ano sentaram-se apreensivos no refeitório à espera dos colegas.
Entretanto, o Avião ia a toda a velocidade pela estrada do Regato na sua mota virtual.
«Vou ficar famoso. Hei de ser eu a encontrá-los».
- Zzzzzzzzz
Ao chegar à cruz do Regato parou.
«E agora? Para onde terão ido? Castelos ou Vilar?».
Foi na direção do Vilar. Pouco depois, cruzou-se com o João que ia a pé para Ourém e perguntou-lhe:
- Viste um jeep com três miúdos?
O João resolveu gozar:
- Vi, sim. Iam na direção do Vilar.
E o pobre do Avião lá se enfiou pela estrada do Vilar dos Prazeres numa busca infrutífera. Depois de correr mais de dois quilómetros encontrou uma loja de móveis. À frente dela, estava um velhote sentado num banco com um pau na mão e resolveu perguntar-lhe:
- O senhor viu passar aqui o jeep dos bombeiros com três miúdos lá dentro?
O velhote olhou-o irritado e respondeu:
- Meu amigo, não vi ninguém, garanto que não vi ninguém. E nunca lhe ensinaram que antes de dirigir-se a uma pessoa mais velha deve dizer bom-dia ou boa-tarde?
- Custa-me a crer que não os tivesse visto. O João, filho do comandante, disse que os viu nesta direção.
- Está a duvidar de mim? Vou ensiná-lo a ser um rapaz mais educado.
Levantou o pau e desfechou em cima do Zé Rito. O que lhe valeu foi que o Zé saltou de lado e evitou o golpe que podia ser fatal. Mas estava em maus lençóis. O velhote parecia doido. Espumava de raiva, não compreendendo que a sua chegada apressada não lhe tinha permitido ser absolutamente correto.
Mas o nosso Avião era muito rápido, muito mais do que uma pessoa de idade. Com um salto afastou-se enquanto ouvia um carro a fazer uma travagem. Lá dentro, vinham dois bombeiros:
- É o Zé Rito. Que fará aqui?
Num instante correram e detiveram o homem de idade.
- Tenha calma, ti’Alberto. Andamos à procura de três miúdos e um jeep roubado em Ourém.
Num instante, o velhote acalmou e voltou a garantir:
- Estive aqui toda a tarde. Eles não passaram por aqui. Só vi esse arruaceiro que duvidou de mim.
E o carro dos bombeiros, onde agora seguia o nosso querido Avião ainda surpreso com o desfecho da sua aventura, regressou a Ourém depois de uma busca falhada.

terça-feira, março 03, 2020

O desvio do jeep

Quando chegaram junto dos carros dos bombeiros, os miúdos ficaram encantados.
- Olha que carro tão giro – dizia a Ciete apontando o autotanque.
- E aquela é a ambulância conduzida pelo ti’ Júlio – respondeu o Julito, apontando outro carro – Tem ajudado a salvar centenas de vidas.
O comandante decidiu então uma coisa que alegrou muito toda a miudagem.
- Vamos dar uma volta com vocês pela vila. Tomem lugar nos carros.
Havia um jeep e um carro maior com muitos lugares disponíveis para o passeio ambos já com os respetivos motoristas a postos. A ideia era dar uma volta à vila indo na direção de Tomar e, junto à bomba de gasolina, virar para a rua de Santa Teresinha e regressar pela parte debaixo da vila. Claro que as famílias estariam a ver o que seria uma grande alegria para todos.
O Estorietas, o Amândio e a Mari’mília tomaram lugar no jeep, os outros estudantes foram para o carro maior. E o cortejo da turma do segundo ano do CFL em carro de bombeiros iniciou-se pelas ruas de Ourém.
- Olhem, – dizia a Ciete para os amigos – está ali o meu pai.
Efetivamente, com cara de poucos amigos, o sr. Bragança contemplava aquela cena pensando como era possível tal desvario, tanta insegurança entre a miudagem. Mas os carros lá seguiam pela Avenida indiferentes a tudo. O carro maior à frente, atrás o jeep com o Estorietas ao lado do motorista em pé como via fazer aos bombeiros, mas bem agarrado ao painel frontal. E assim foram percorrendo Ourém.
Mais à frente, o pai da Leninha mostrava as suas habilidades em cima da bicicleta, conduzindo com as pernas viradas para a faixa central da estrada, enquanto lá atrás se ouvia o ruído das sirenes dos carros. Um equilíbrio notável.
Frente à tipografia do Melo, o bombeiro que conduzia o jeep e, quando o outro carro já não se via, parou e disse:
- Vou ali ao Central comprar tabaco. Esperem por mim, é um instantinho.
E abandonou o jeep, deixando as chaves no interior do mesmo.
- Estou farta disto – dizia a Nicha – precisava de ir a casa a Peras Ruivas almoçar e nunca mais nos despacham. Vou perder a camioneta da uma.
Como o Amândio tinha mais uns anitos, o Estorietas perguntou-lhe:
- Não eras capaz de conduzir isto? Podíamos ir pôr a Nicha a casa e voltar…
O Amândio, que já tinha feito a partida do dia, retraiu-se:
- É melhor não. O dr. Armando ainda nos dá uma sova.
Nesse momento, chegou um rapaz um pouco mais velho, louro, com bom aspeto junto deles.
- Olá. O que estão a fazer aqui?
O Estorietas já o conhecia. Era o João, filho do comandante dos bombeiros, e passava muitas vezes na rua de Castela a conduzir um automóvel em alta velocidade.
- Estamos à espera do bombeiro. Mas demora-se tanto e aqui a nossa colega precisava de chegar a Peras Ruivas para almoçar.
- Ah! Eu levo-os lá.
Saltou para dentro do carro, ligou-o e logo acelerou fortemente fazendo o carro saltar e arrancar com tal velocidade, depois de as rodas chiarem como umas loucas, que o Estorietas ficou logo sentado a seu lado.
- Aiiiôôô, Silver!!! – gritava o João.
Pouco depois, desciam na direção do regato.
Numa passadeira, uma senhora de mais idade ia a atravessar.
- Ah! Ah! Vou passar-lhe por cima.
Mas era só a gozar. Travou com força um metro antes da passadeira e o Estorietas ia sendo cuspido. O indivíduo era meio louco e fazia seguir o carro com elevada velocidade pelo que começavam a ter algum receio. Pelo caminho, ia rosnando:
- Eu sou o melhor condutor de Ourém. Vão ver como eu conduzo.
- Vai com mais calma, senão ficamos aqui…
Viraram na direção do Vilar, mas, uns cem metros à frente, tomaram a direção do Carregal. Aí ele virou-se para trás e olhou o Amândio, enquanto o carro continuava em frente:
- E tu, donde és? Não te conheço.
- Sou da Urqueira…
- Da Urqueira? E como vens para o colégio?
- Venho todos os dias de bicicleta…
Continuou a olhar para trás enquanto o Estorietas ao seu lado de vez em quando fazia o gesto de travar.
- E tu? És bem bonita. Também andas no colégio?
- Sim, sou colega do Luís e do Amândio…
- Tenho a impressão que vou passar a visitar o colégio mais vezes.
- Tem cuidado – disse o Estorietas. – Olha que o sr. Nunes não é para brincadeiras está sempre de atalaia.
- Pensas… aquele pinhal esconde muitos segredos que ele nunca desvendou.
O carro seguia agora mais devagar. O João parecia bem mais calmo, mas de repente sentiu-se que algo não estava bem. O jeep começou a soluçar e pouco depois parou junto à quinta de Santa Bárbara.
- Bolas! Há qualquer coisa que não está bem. Não deve ter gasolina.
Saltou do carro e disse para os miúdos:
- Têm de seguir a pé. Peras Ruivas já não é longe. Eu regresso a Ourém para pedir um reboque.
Entretanto, em Ourém, quando o legítimo condutor do jeep chegou ao local onde tinha deixado o carro notou que o mesmo já ali não estava e lançou as mãos à cabeça.
- Ai! Agora é que estou tramado…

segunda-feira, março 02, 2020

O toque da sirene

Já passava das 11 horas quando a porta do salão se abriu e o Julito convidou os outros miúdos a seguirem-no ao piso inferior.
Depois de um lanço de escadas pararam junto de um botão vermelho.
- O que estão a ver é o comando da nossa sirene. Sempre que necessitamos de bombeiros para algum problema é com ela que os avisamos.
- E os toques têm algum significado? – perguntou o Estorietas.
- Neste momento, está mais ou menos convencionado para todo o país o seguinte:
1 Toque: Necessidade de Bombeiros para Intervenção em Acidente de Viação
2 Toques: Necessidade de Bombeiros para Intervenção em Acidente de Viação com Encarcerados
3 Toques: Necessidade de Bombeiros para Intervenção em Incêndio Florestal ou Inculto (rural)
4 Toques: Necessidade de Bombeiros para Intervenção em Incêndio Urbano
- Não podemos ouvir um toque? – perguntou o Amândio
- Não convém. Isso iria chamar escusadamente outros bombeiros ao quartel. Agora vamos ver o nosso pátio onde por vezes se desenrolam alguns dos nossos exercícios.
E avançaram todos, atrás do Julito, para o pátio do quartel.
Sem ninguém dar por isso, o Amândio deixou-se ficar para trás e, quando ninguém o via, pressionou o botão da sirene.
- Uma… duas… três… quatro – murmurou. – Toque para incêndio urbano. Vamos ver o que acontece.
E escapuliu-se.
No pátio, os miúdos ouviram a sirene e ficaram excitados.
- Olha a sirene a tocar. Vamos ver...
- Tenham cuidado – disse o Julito. – Não se metam à frente dos carros.
Pouco depois, começaram a ver chegar esbaforidos algumas pessoas que começavam logo a fardar-se e a saltar para dentro dos carros.
- Então, onde é o fogo? – perguntou o Joia.
Nesse momento, apareceram o comandante, o Dr. Albano e o Dr. Armando.
- Quem é que tocou a sirene de incêndio?
Foi um silêncio abissal. O Amândio já se tinha juntado ao resto do grupo sem ninguém ter dado pela sua ausência e permaneceu calado como se não fosse nada com ele.
Os voluntários que tinham comparecido perceberam logo.
- Deve ter havido um engraçadinho. – disse o Joia – Mas deviam calcular que estávamos no trabalho.
O malandro do Amândio, esse, ria-se à socapa e deu um toque ao Estorietas.
- Pensavam que passavam a manhã a torturarem-nos e a gozar connosco. Foi bem feita…
Do outro lado, o Dr. Armando prometia-as:
- Se sei que foi algum de vocês, vai ficar com o traseiro bem quente…
Mas o comandante acalmou-o:
- Tenha calma, doutor, não há problema. Foi qualquer distração que não se repetirá. E ainda bem que não houve nada, pois assim os miúdos podem ver e experimentar os nossos carros.

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