Um 11 de Março de há 30 anos recordado à dimensão apropriada para blog Por Sérgio Ribeiro
O Luís pediu (pediu?, convidou!, desafiou!, ordenou!…) que escrevesse sobre o 11 de Março de 1975. Difícil, sobretudo fazê-lo à dimensão do tempo que tenho e de ser suportável por um blog.
Só duas ou três notas. Com a minha verdade histórica.
O 25 de Abril de 1974, abertas as portas das prisões, onde estávamos presos todos nós, e alguns de nós em particular, depois da euforia e indefinição das primeiras horas, recomeçou a luta (de classes, digo eu…).
Que tomou a forma de controlo da economia. Os 7 grandes grupos económicos que dominavam a economia e a finança tinham um poder sobre a sociedade portuguesa verdadeiramente tentacular, e os novos caminhos, a trilhar em liberdade e democracia, teriam de beliscar esse poder. Que não gosta de o ser. Foi a luta entre um poder político a democratizar-se – e a querer desenvolver e descolonizar – e um poder económico alapado aos proteccionismos de todo o tipo.
O primeiro confronto terá sido com a proposta de um “movimento” de empresários (MDSE) que se propôs “gerir a política”, com Spínola, que fora nº 2 de Champlimaud na Siderurgia Nacional, SA, a servir de ponte. Quase logo, ou ao mesmo tempo, o apelo à “maioria silenciosa” e o ensaio do 28 de Setembro.
Mas o poder político, os governos provisórios – com os partidos neles representados (PPD, PS, MDP/CDE, PCP) – e o MFA, resistiu a essa tentativa do poder económico-financeiro de recuperação do controlo total sobre a vida social portuguesa.
No final do ano de 1974, apareceram os alarmes, catastrofistas e falsos, quanto aos défices e à situação da economia e finanças portuguesas, e apareceram uns planos “de rigor”, com Melo Antunes e Vítor Constâncio a serem protagonistas, mas era evidente que, sem o controlo da banca e sem a subordinação dos grandes grupos ao novo poder político, não haveria novos caminhos.
Os confrontos iam-se agudizando, dentro dos “poderes”, entre o poder político, inseguro e heterogéneo, e o poder económico, nada disposto a perder posições e a submeter-se a objectivos que não controlasse.
Como o poder real estava nas mãos dos militares, o conflito eclodiu em golpe e contra-golpe, utilizando grupos e armas, e foi o 11 de Março. Que, na minha versão, começou por ser uma tentativa do poder económico tomar o poder pela via das forças armadas, com uma reacção, ainda das forças armadas e populares, para se prosseguir pelas portas que Abril abrira, como disse o poeta.
Ganharam estas forças. Do 11 de Março resultou a grande leva de nacionalizações, o esforço para que o poder económico ficasse, de vez, subordinado ao poder político, tal como se ia organizando.
Mais dois apontamentos.
1. A vitória desde logo se sabia (quem sabia…) efémera, porque a luta iria continuar por outras (e todas!) as formas, desde a demissão de ministros do 4º governo provisório que o derrubariam, até ao terrorismo que surgiu em Portugal. E assim foi continuando, com o derrube do 5º governo, com o remendo que foi o 6º governo, com o 25 de Novembro.
2. Apesar de tudo, e não obstante parecer pretender-se esquecê-lo, foi cumprido, escrupulosamente, o calendário que marcava eleições no prazo de ano a contar de 25 de Abril de 1974: a 25 de Abril de 1975 houve eleições para a Assembleia Constituinte! O 11 de Março não o impediu. Talvez sem o 11 de Março, como ele foi, assim não tivesse sido.
Com o 11 de Março foram criadas condições para se fazer um caminho que estava delineado desde 25 de Abril de 1974, mas ele foi, sempre, combatido, sabotado, traído. Continua a sê-lo por quem conta a História de outra maneira.
Isto digo eu, claro. Que a conto assim. Porque assim a vivi.