segunda-feira, agosto 26, 2019

A carta

Eis-me de novo na Cidade da Luz, e a minha primeira sensação é de desgosto. Tudo me parece insuportável: o cinzento das ruas e dos edifícios, as mulheres vestidas de gala, as conversas que ouço por acaso no boulevard Saint-Michel e na avenue d'Orléans, as lembranças assaltam-me por todo o lado. Senti-me triste e assustada. Recordei os sentimentos, as emoções e os pensamentos e fiquei triste porque não regressam. Eram fruto da despreocupação da juventude e sei que não voltarão. Mas que pena já não poder pensar, sentir e ver como antes. A vida passa e é realmente triste. Triste porque Arosa foi apenas um momento de passagem, um lugar transitório. Em Arosa ainda estávamos perto de Cracóvia, enquanto em Paris tudo é definitivo e sem esperança. Separados. Nós, meu querido, estamos separados. E é tão doloroso para mim. Sei muito bem, sinto que nunca mais voltarás aqui. E ao rever estes lugares tão familiares percebi claramente, como nunca, o lugar gigantesco que ocupaste na minha vida quando estávamos juntos em Paris. Tudo o que fazia estava ligado por mil fios ao meu pensamento em ti. Não estava apaixonada, é certo, mas já te amava. Hoje, como então, poderia renunciar aos teus beijos se pudesse voltar a falar contigo, só algumas vezes. Para mim, seria uma alegria e não faria mal a ninguém. Porque me impediste? Perguntas-me se estou zangada pela tua decisão de romper. Não, porque penso que não foste tu a desejá-lo.

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