terça-feira, dezembro 31, 2019

Prisioneiras da Guarda da Revolução


A primeira noite numa prisão chinesa foi horrível para as duas manas. Cercadas por mais de quinze presos do género feminino numa cela sem as menores condições tinham um catre estreitíssimo para se deitar e um misero cobertor para se cobrir. Passaram a noite a chorar sempre olhadas com estranheza por uma série de mulheres de raça amarela. A língua era um problema enorme e fazia com não se conseguissem entender com mais nenhum preso. Na cela ao lado, ainda em piores condições, estavam os homens e passaram a noite a ouvir aquelas cuspidelas horrorosas que as enojavam.
Pela manhã, foram chamadas ao comandante da Guarda da Revolução o qual se rodeou de um intérprete que falava inglês e foi nesta língua que o diálogo se desenvolveu:
- Quem é o vosso chefe?
A Céu, mais resoluta, tentou contar a história do casino e o estranho contacto com um cavalheiro que lhes pediu para trazer os barcos com uma encomenda cujo conteúdo desconheciam.
Ao ter conhecimento da resposta da jovem, o oficial chinês ficou bastante irritado.
- Ele diz que vocês estão a mentir, a gozar com o povo chinês – disse o intérprete. – Se não falarem ficam na prisão toda a vida.
As duas irmãs desataram a chorar e, mais uma vez, garantiram que estavam a dizer toda a verdade. Foram forçadas a regressar à cela e, pouco depois, foram conduzidas ao refeitório da prisão para almoçar.
Era um recinto enorme que já estava cheio de pessoas andrajosas e terrivelmente tristes. Um guarda indicou-lhes dois lugares junto a outras reclusas. Repararam que tinham uma pulseira com um número igual ao que estava no lugar que iam ocupar.
Um conjunto de homens, na sua maioria chineses, foi trazendo a comida para as mesas. Um deles que parecia ocidental trouxe uma travessa com arroz, legumes cozinhados e uns fritos esquisitos. A Céu perguntou em inglês:
- O que é isto?
O indivíduo com aspeto ocidental respondeu na mesma língua:
- Orelhas de macaco fritas.
- Que horror! – gritou a Ciete, levando as mãos à cara. – Não consigo comer isso.
- Prove, porque não é mau – respondeu o serviçal. – Ao jantar, são gafanhotos grelhados…
A Céu, mais decidida, perguntou ao guarda serviçal:
- Como podemos avisar as nossas famílias que estamos aqui presas?
- Enquanto não apurarem a verdade, não têm hipótese de contatar ninguém.
No fundo, as orelhas de macaco nem foram o pior da estória. As duas irmãs comeram conforme puderam e recolheram à cela onde se deitaram no catre a chorar convulsivamente.
- E agora? Que vai ser de nós aqui fechadas? – dizia a Céu.
- A culpa é toda tua com a mania dos ganhos em casinos.
- Nunca mais entro num local desses. Mas o importante era avisar alguém do nosso país. Talvez o professor Marcelo pudesse fazer alguma coisa…
- Achas? O mais provável era ir dar um abraço de consolação ao nosso paizinho e pregava-lhe um susto enorme…




Como veem, meus amigos, a eterna juventude da Céu e da Ciete acabou por as colocar numa situação delicada. Que fazer? Como conseguiria chegar às autoridades portuguesas o relato da sua situação?

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