Era uma noite quente de quase Verão. A miudagem de Ourém encontrava-se no café e dava longos passeios pela Avenida e até ao jardim frente à Câmara. Entre eles estava o João, mas um João um pouco triste, pois, havia uma série de dias que a Teresinha não se juntava ao grupo, passando todo o tempo a estudar para exames.
Nessa noite, o Zé Manel trouxe a sua viola e uma ideia mirabolante ocorreu de imediato ao João.
- Zé, anda comigo vamos fazer uma serenata a uma miúda…
- Pá, eu não te consigo acompanhar. Só posso tocar «A brasileirinha».
- Não faz mal, dás uns acordos espaçados e eu canto. Basta que sigas o mesmo ritmo.
O Zé Manel lá se dispôs e, com o seu ar sonolento que fazia lembrar o Bob Dylan, acompanhou o João.
- Espera, ao menos ensaia um pouco…
- Pá, não me vou pôr a cantar no meio desta malta toda. Pensam que estou maluco.
- Então, vamos até ao pé da escola das meninas e, lá, podes erguer a tua voz.
Assim fizeram. Afastaram-se do grupo com uma pequena desculpa e, pouco depois, o João cantava:
«O meu desejo / é dar-te um beijo / é ter desejo / de te beijar…»
O rapaz nem cantava mal, pode-se garantir, mas nunca sentira aquele chamamento para a arte de cantar. A verdade é que, com tanta afinação, o Zé Manel em pouco tempo acertou o acompanhamento e, pouco depois, dizia:
- Bom, parece que funciona. Aonde vamos então?
- Frente à casa da Teresinha…
- Ena. Perdeste o juízo ou quê? Olha que ela tem uns irmãos mais velhos e a Céu também não me parece para brincadeiras.
- Que é que pensavas? Querias que te acompanhasse a Alcanena, não?
- Essa história da miúda de Alcanena é invenção tua. Nunca existiu tal miúda. Olha que, se a coisa der para o torto, piro-me logo. Não quero nada com o Luís ou o Taito.
- Vamos lá, vá… - dizia o João já agitado.
E dirigiram-se para a frente da pensão Simões que ficava na Avenida quase em frente ao cineteatro. Nesse dia, não havia sessão de cinema pelo que praticamente não se via ninguém na rua.
E, pouco depois, o João satisfazia o frémito do seu coração e elevava a sua voz numa canção lancinante procurando que a Teresinha aparecesse à janela.
Lá dentro, a pequena esforçava-se por estudar.
«Bolas! Isto está difícil. Por que hei de ter exames e os outros todos a passear?»
De repente, ouviu aquilo…
«Estranho! Alguém parece estar a cantar na rua. E tem acompanhamento. Que se passará?»
Foi até à janela e abriu-a. E foi então que viu o cantor e acompanhante e quase se sentiu sufocar. Lá fora, estava o seu amigo João, um verdadeiro pinga-amor, a cantar uma balada conhecida, sendo acompanhado pelo Zé Manel.
Ao princípio, não conseguiu balbuciar palavra. Depois, pensamentos preocupantes começaram a invadi-la: que iria pensar a família? Os vizinhos? Os outros amigos? E arranjou força para falar:
- João, o que é que te deu?
Ele nem respondeu. Continuou a cantar e a Teresinha notou que já outras pessoas chegavam à janela.
«Que irão pensar de mim? Eu, uma menina sempre ajuizada…»
E gritou lá para baixo:
- João, para com isso ou chamo a polícia.
Mas ele não se calava. A balada parecia ser interminável e ele arranjava sempre forma de repetir, repetir…
A miúda sentiu-se afogueada. Como poderia acabar com aquilo?
Olhou para o lado e viu um saco de farinha que devia pesar uns vinte quilos. Ainda avisou:
- João, para com isso ou arrependes-te.
Foi inútil. Ela não encontrou outra solução. Pegou no saco e atirou-o para cima do João, fechando de imediato a janela. Como por encanto, o silêncio voltou a Ourém
Nessa noite, o Zé Manel trouxe a sua viola e uma ideia mirabolante ocorreu de imediato ao João.
- Zé, anda comigo vamos fazer uma serenata a uma miúda…
- Pá, eu não te consigo acompanhar. Só posso tocar «A brasileirinha».
- Não faz mal, dás uns acordos espaçados e eu canto. Basta que sigas o mesmo ritmo.
O Zé Manel lá se dispôs e, com o seu ar sonolento que fazia lembrar o Bob Dylan, acompanhou o João.
- Espera, ao menos ensaia um pouco…
- Pá, não me vou pôr a cantar no meio desta malta toda. Pensam que estou maluco.
- Então, vamos até ao pé da escola das meninas e, lá, podes erguer a tua voz.
Assim fizeram. Afastaram-se do grupo com uma pequena desculpa e, pouco depois, o João cantava:
«O meu desejo / é dar-te um beijo / é ter desejo / de te beijar…»
O rapaz nem cantava mal, pode-se garantir, mas nunca sentira aquele chamamento para a arte de cantar. A verdade é que, com tanta afinação, o Zé Manel em pouco tempo acertou o acompanhamento e, pouco depois, dizia:
- Bom, parece que funciona. Aonde vamos então?
- Frente à casa da Teresinha…
- Ena. Perdeste o juízo ou quê? Olha que ela tem uns irmãos mais velhos e a Céu também não me parece para brincadeiras.
- Que é que pensavas? Querias que te acompanhasse a Alcanena, não?
- Essa história da miúda de Alcanena é invenção tua. Nunca existiu tal miúda. Olha que, se a coisa der para o torto, piro-me logo. Não quero nada com o Luís ou o Taito.
- Vamos lá, vá… - dizia o João já agitado.
E dirigiram-se para a frente da pensão Simões que ficava na Avenida quase em frente ao cineteatro. Nesse dia, não havia sessão de cinema pelo que praticamente não se via ninguém na rua.
E, pouco depois, o João satisfazia o frémito do seu coração e elevava a sua voz numa canção lancinante procurando que a Teresinha aparecesse à janela.
Lá dentro, a pequena esforçava-se por estudar.
«Bolas! Isto está difícil. Por que hei de ter exames e os outros todos a passear?»
De repente, ouviu aquilo…
«Estranho! Alguém parece estar a cantar na rua. E tem acompanhamento. Que se passará?»
Foi até à janela e abriu-a. E foi então que viu o cantor e acompanhante e quase se sentiu sufocar. Lá fora, estava o seu amigo João, um verdadeiro pinga-amor, a cantar uma balada conhecida, sendo acompanhado pelo Zé Manel.
Ao princípio, não conseguiu balbuciar palavra. Depois, pensamentos preocupantes começaram a invadi-la: que iria pensar a família? Os vizinhos? Os outros amigos? E arranjou força para falar:
- João, o que é que te deu?
Ele nem respondeu. Continuou a cantar e a Teresinha notou que já outras pessoas chegavam à janela.
«Que irão pensar de mim? Eu, uma menina sempre ajuizada…»
E gritou lá para baixo:
- João, para com isso ou chamo a polícia.
Mas ele não se calava. A balada parecia ser interminável e ele arranjava sempre forma de repetir, repetir…
A miúda sentiu-se afogueada. Como poderia acabar com aquilo?
Olhou para o lado e viu um saco de farinha que devia pesar uns vinte quilos. Ainda avisou:
- João, para com isso ou arrependes-te.
Foi inútil. Ela não encontrou outra solução. Pegou no saco e atirou-o para cima do João, fechando de imediato a janela. Como por encanto, o silêncio voltou a Ourém
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