Penso que conseguem avaliar o sacrifício de alguém que trabalha numa empresa multinacional e, em simultâneo, frequenta um curso. No caso do Estorietas, isto era elevado ao expoente máximo. Nem sei como foi possível, olho para trás e compreendo os colegas que me chamavam louco. Imaginem esta rotina diária:
-Levantar pelas 5.30
- Às 7, apanhar o comboio, sair em Alcântara, apanhar o autocarro, atravessar o Casal Ventoso em deprimente espetáculo, sair perto da Penitenciária.
- Pelas 8, junto ao Palácio da Justiça, descer umas escadas de acesso à Nova, atravessar o edifício e entrar no Instituto de Estatística e Gestão da informação. Assistir a aulas.
- Pelas 11, sair, subir as escadas, descer o parque Eduardo Sétimo e pouco depois entrar na Shell, na Avenida da Liberdade.
- Despachar coisas, almoçar
- Pelas 14, apanhar o autocarro 6, ir dar uma aula ao ISEG e retornar
- Trabalhar mais um bocadinho
- Pelas 18.30, sair para o ISEG para frequentar outro Mestrado
- Chegar a casa e cair na cama como morto.
Isto ocorreu muitas vezes no ano letivo de 1996/97. Claro que havia um local onde alguém me observava e não estava satisfeito. E, apesar de uns dias antes, me ter sido atribuído um prémio de desempenho, não tiveram o menor problema em me chamar a uma sala e aplicar-me o castigo dos castigos para os que trabalhem por conta de outrem. Ainda recordo a cara do cínico:
- Luís, vais ter oportunidade de fazer o que quiseres.
Eu não entendi muito bem, mas ele explicitou:
- Levas umas brasas e vais bazar daqui para fora. Assim, podes frequentar mestrados à vontade…
Fizeram as contas. Eu também não me ralei muito apesar do choque momentâneo e do choque na família. Até pedi para me deixarem sair mais cedo. Estava farto deles porque aquela subjugação era exasperante. Não se fazia o que era lógico. Quem mandava era o grupo que, sistematicamente, tirava o tapete a quem pensava estar mais ou menos tranquilo. Eram todos uns cagados que não alinhavam nos magníficos ensinamentos do Estorietas.
Os colegas também eram uns cínicos, sempre a chamar a atenção para o facto de não estar presente por ter ido para o Mestrado. Resta acrescentar que só entrei naquela empresa com uma autorização expressa da administração da mesma para dar aulas… a qual foi em breve esquecida apesar dos meus magníficos serviços.
E, cheio de massas, dediquei-me ao ensino… nunca mais lá pus os pés…
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