Revejo-me a descer do largo de Castela para a Avenida. Levo um saco grande na mão, talvez com um metro de altura e uns trinta centímetros de diâmetro. É castanho, feito de uma matéria que me parece linhaça ou sarja, mas a minha santa ignorância não consegue classifica-lo.
Lá dentro sente-se que algo mexe. É a minha gatinha de cor branca e preta, vai dentro do saco para não reconhecer o caminho e não ter tentações de voltar à origem. Pobre bicho que tem de aturar as loucuras dos humanos...
Atravesso a Avenida e viro à esquerda. Frente ao edifício do cineteatro, viro à direita e inicio a descida. Passo em frente à casa onde conheci distinto oureense que há uns anos me ofertou saboroso arroz de cabidela na Gondemaria e que, como saberão daqui a uns dias, enfrentava os cruzamentos dando um murro no automóvel concorrente à prioridade...
Um pouco mais abaixo, frente à morgue, acelero o passo. Sempre que ali passava tinha receio que algum defunto me perseguisse.
Num instante chego à estrada, passo frente à alfaiataria do Zé Canoa e inicio o pequeno morro que me leva à nova casinha.
Ali, faço as apresentações à gatinha. Vê o quintal, vê os quartos, enfim tudo parece em ordem, a adaptação parece não trazer problemas.
***
Passaram um ou dois dias. Oiço a minha mãe:
- Luís, não sei da gata...
Foi o desespero. E se ela era engraçada e brincalhona.
Mas eis que chega a salvação. Alguém da rua de Castela traz a notícia.
- Sabem, a V. gata não sai de ao pé da antiga casa.
É verdade, apesar da nossa tentativa, o bicho tinha conseguido reconhecer o caminho e voltar. Com maiores cuidados, fomos buscá-la e, como o sítio para onde mudámos, era idílico, ela acabou por se adaptar.
Foram precisos muitos anos para distinto oureense compreender, aceitar e acabar por sentir esta fixação na casa do Largo de Castela.
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