Eis um texto do mesmo período do anterior sobre a vida dos cadetes nas casernas em Mafra e que, se bem me lembro, tem um cheirinho à semana de campo. Já não recordo os pormenores que lhe estão associados. Sei que não foi publicado e não tenho a certeza se o cheguei a enviar a algum dos jornais e depois me foi devolvido, pois disponho do manuscrito. Talvez aquela parte final, sobre a guerra e a paz, um pouco chocha, me tivesse levado a optar por esperar por melhor inspiração. Agora, segue como estava...
Há um pormenor engraçado e constante a estes grandes ajuntamentos: geralmente, surge uma viola e há alguém que sabe alguma cantiga engraçada. Recordo que, na caminhada para a semana de campo, alguns cantávamos aqueles versos.
A vi(o)la da loucura
Praguejante, a viola ouvir-se-ia em toda a vila, contando da tensão das vidas dos que nela se empenhavam (e não eram poucos admitindo estarem neles também os que a escutavam), não fossem as conventuais paredes brancas, abertas ao meio por quebras que as separavam de outras iguais (vidas), numa simetria rígida que só as consciências de tão desiguais podiam quebrar, apesar do empenhamento entendido como meio de chacota, libertação, frustração…
Viola, ó vila, ouvi-la.
Os corpos, sequestrados e doridos, lançavam para o ar o que no passado aprenderam, por no presente o interesse ser reduzido, testemunho da sua aversão às novidades oferecidas, as quais, contudo, os dominavam numa inutilidade só aparente para alguns e bem real para todos os outros que eram os que lá estavam por conta desses, violando na vila sem ouvi-la, lá, onde as paredes eram mais grossas e vigiadas por gendarmes cuja missão era não deixar entrar ou sair sem todos os preceitos bem dedilhados agora em cordas que não se partiriam a não ser por revoltosos e vitoriosos.
Não há machado que corte
a raiz ao pensamento
porque é livre
como o vento
porque é livre…
Libertas, as vozes conduziam sonâmbulos para mundos bem diferentes cujos povos eram a antítese daquilo que eles eram, povos que paz-avam, onde a rádio quase diariamente diria "Rebentou a paz" e as crianças brincariam não com pistolas e tanques mas trocando frases de amor que, num Natal que só não se comemorava a 25 do 12, os pais lhes ofereceriam. Tristes viram então: só rebenta a paz onde haja a guerra.
E a minha voz bem real trouxe-os ao momento que todos queríamos abandonar: "está na hora". Fomos em direcção ao presente.
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