quinta-feira, junho 10, 2004

A casa da Rua de Santa Teresinha
Curiosamente, a adaptação à nova casa não foi difícil. Há com certeza explicação lógica para isso. Conhecia-a desde que tinha nascido, pois antes habitavam lá uns tios e ela, a tia, foi a minha segunda mãe. Pessoas boas, muito amigas, que me trataram sempre o melhor possível. Lembro-me que até tinha um quarto especial onde podia pernoitar quando não me apetecia regressar a Castela.
Os tios tinham vários atractivos: um bastante importante foi a colecção do Cavaleiro Andante que me ofereceram quase desde o início e que eu suspendi a uns trinta números do final. Outros eram os brinquedos. Recordo com especial carinho uma corneta que me foi oferecida pela Feira Nova e que eu usava mal acordava a imaginar que estava nos exércitos do General Custer em momento de ataque ao Sitting Bull. O toque era tão elevado, lancinante e apelativo que toda a gente acordava e tinha que formar. Não sei porquê, um dia a corneta desapareceu e, apesar da bondade deles, nunca consegui a substituição em termos realmente satisfatórios.
Mas não foi esse o único motivo de adaptação fácil. É que, em férias, tinha a boa companhia do Rui e ainda me lembro do Jó Rodrigues quando morava na casa onde hoje habita o Sr. Paisana. Para completar a quadrilha, havia ainda o Zé Quim à frente. Nisto tudo pode ter havido algum desfasamento temporal que terá feito que nunca estivéssemos os quatro.
Chegar dali ao Central e ao Avenida era relativamente fácil. Visitar a casa do Largo de Castela também era possível pois foi habitada pela Aurorita e pelo João Honório bons amigos que mais tarde vim a reencontrar em Leiria.
E foi a nova casa que um dia demonstrou que a minha fé num ser humano é imensa.
Como consta da lenda, as portas estavam sempre abertas ou nos trincos. Nesse dia, a minha mãe estava para o quintal. Eu lia qualquer coisa quando ouvi um certo ruído, um ruído baixo que não cessava, mas que também se não definia. Vim até à porta da rua e apareceu-me uma mulher que eu nunca tinha visto, mas que já tinha aberto a porta por completo e iniciado o processo de entrada.
- A senhora precisa de alguma coisa?
Ela ficou embasbacada, mas ripostou:
- Não é aqui que mora a Maria?
- Ah! Eu vou chamar…
E deixei-a em paz, fui chamar a minha mãe a quem contei o sucedido.
- Mãe, está uma senhora à procura da Maria…
Viemos até à entrada. Claro que já lá não estava ninguém. Em vão a procurámos até à zona do hospital.
Não sei se o prejuízo foi grande ou pequeno - como não era materialista, isso não me preocupava muito. Sei que ouvi das boas por acreditar tão facilmente nas nobres intenções do ser humano.

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